O BRASIL DE DARCY RIBEIRO E ROBERTO DAMATTA : UMA INTERPRETAÇÃO SÓCIO-ANTROPOLÓGICA PARA UM ENTENDIMENTO DA NAÇÃO E DO
BRASILEIRO DO PONTO DE VISTA RELACIONAL E TRIDIMENSIONAL.
“Desigualdades
sociais profundas dividiam os baianos entre senhores e escravos, brancos e
negros, ricos e pobres livres e libertos. O número destes, sobretudo mestiços e
negros, vinha crescendo vigorosamente desde a segunda metade do século XVIII.
Entretanto, como ocorreu em outras sociedades escravagistas, a economia baiana
mostrou-se pouco flexível à incorporação da mão de obra livre ao mercado de
trabalho. Por conta disso, o homem livre assumia a condição de verdadeiro
deslocado. A escassez de empregos obrigava a maioria deste contingente livre a
viver de ocupações passageiras e instáveis. Além do mais, havia da parte dos
homens livres pobres uma atitude de permanente desconfiança e, em certos casos,
até de recusa em vender sua força de trabalho. Para muitos homens livres era
preferível viver na mendicância a se sujeitarem a relações de trabalho que os
equiparasse à condição e escravos. Dentro dos referenciais de uma sociedade
escravista, o fato de não possuírem escravos e viverem do próprio trabalho já
era sinal de extrema pobreza.” (FRAGA FILHO, Walter. Mendigos, moleques e
vadios. Salvador: EDUFBA, 1996)
Sobre
a fundação do mundo brasileiro, fração luso-africana em terras ameríndias se
pode afirmar que se deve a um conflituoso e bélico processo social, político e
cultural, onde possa-se entender bélico, não apenas, no seu sentido original
mas também, na perspectiva de enfrentamento biológico e ecológico,
enfrentamento das forças produtivas europeias e o continente americano em
exploração.
Essa
“guerra” étnica, religiosa, ideológica daria origem a uma América lusófona,
essencialmente hibrida racial e genesicamente indeterminada entre os poderes de
uma classe dirigente atrelada à economia externa e um povo subalternizado em
suas determinações históricas.
Assim,
uma “comunidade imaginada” inventa a realidade formal para ordenar as relações
sociais, vivificando seu desenho e contornos num plano de nação em suas
contradições, bem como suas gradações de sentido sociológico e antropológico,
com questões que lhe são caras, como o mito da “democracia racial” e a questão
do Estado de direito orientado pela violência e exclusão social.
A
compreensão deste país aos olhos dos autores que intitulam esse ensaio, vão ao
encontro dos pontos críticos que puncionam as ambiguidades e atualizam os
privilégios de cor, de classe e a saber, de um modo vivendi que corporifica através de práticas e condutas como o servilismo, o
preconceito, a patronagem, a reificação de uma consciência nacional socialmente
assentada no “desfazimento” e caldeamento que dissolvem um pretensa
auto-identificação de um “povo novo”.
I.
Se
tomarmos como ponto de partida a “herança”, ou melhor, a marca indelével
gravada na pele e no tecido social da vida brasileira, a sociedade nascida do
fluxo e reflexo escravagista e na acumulação dos senhores de engenho e barões
do café, reproduz sobremaneira a dialética capitalista de inspiração hegeliana
– na clássica demonstração da lógica senhor/escravo – a não ser pelo incremento
de um terceiro elemento na operação deste principio científico, que com base no
materialismo histórico, que orienta Darcy Ribeiro – a presença do mestiço.
Que
de alguma forma, enquanto “pobres livres e libertos”, não incorporados
diretamente ao mercado de trabalho, que seria ocupado por imigrantes como
aponta Darcy, se encontram na condição de marginal no processo econômico e
social brasileiro.
Esse
grupo indeterminado, posto entre o establichement e os subalternizados,
produziu um corpus social distinto que, “rejeitando o trabalho que os
equiparasse à condição de escravos” preferiam viver na mendicância, ou armações
e atividades informais ou pequenas ocupações, ainda que em extrema pobreza.
Essa
esfera que se forma, serve de contra peso nos jogos sociais que se operam
dentro da lógica do Brasil formal, que precisando de uma massa refém do
servilismo e dos possíveis benefícios do Estado nacional, dão início ao que de
forma articulada e pensada, segundo Damatta vai ser a base da vida nacional que
é a noção de relação que se estabelece em função de interesses e serviços que
se podem prestar uns aos outros.
II.
Nesse
campo se estabelecia objetivamente a cidadania do brasileiro que nesse sentido
de num misto de transfiguração étnica na ideia darcyniana, aproximada da
inclusão realizada pelo plano institucional no qual a “relação” insere o
sujeito e os grupos gradativamente outorgando-lhes, direitos e, por
conseguinte,privilégios legais.
III.
A
unidade territorial geográfica, linguística da nossa economia política ainda
assim não permite uma uniformidade no plano das relações raciais, éticas, de
gênero e étnica marcada pela luta de classe pela desigualdade social
características de um país colonizado e explorado.
IV.
A
construção de uma “ética múltipla” e triangular que pautada na dialética entre
o liberalismo econômico, o paternalismo, o mercado livre e o capitalismo
hereditário articulando o principio do
escravismo com o individualismo que atinge um campo de influência reflexiva
numa perspectiva relativista. O que no Recôncavo da Bahia, a natureza social
reflete sobremaneira os pontos abarcados pela teoria de Damatta onde um sistema
arquitetado entre parentescos e poder político, poderes econômicos e prestígios
sustentam a exploração do povo negro e alimentam a dominação dos grupos
dirigentes preservando o grupo mediano no balanceamento da estrutura social.
V.
O
status de um povo novo, num gênero humano original, onde o “cunhadismo” foi uma
das primeiras práticas de cordialidade que anteriormente o invasor estrangeiro
é deslocado para a categoria de membro da tribo pelo casamento com uma das
moças índias, dando origem a um não-índio, hibrido este que desde a origem é
sensível a propósitos históricos e sociais alienados.
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