terça-feira, 15 de janeiro de 2013

LAUDA VI





O cientista social entre o distanciamento do objeto e a produção de conhecimento nas Ciências Sociais: Comte-Durkheim, Dilthey-Weber e o pensamento social europeu entre a França e a Alemanha.
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Se o capitalismo é caracterizado entre outras formas pela concorrência, no plano da corrida pela hegemonia intelectual esse traço é ainda mais agudo, senão dizer inevitável. O processo de dominação social, política e econômica no ocidente perpassa de maneira profunda o plano da cultura, mais especificadamente o construto das ideias e, por conseguinte, das práticas que regem a vida social.

Pós revolução industrial e revolução francesa, tem-se um contexto de supremacia do ideário da modernidade racionalista iluminista.Tendo ocorrido na Inglaterra, o empirismo de Bacon e na França os fenômenos desde o enciclopedismo, como a exemplo, a sistematização do poder político de Montesquieu, se encaminhou, então, a humanidade à uma era sem precedentes e que ainda não se pode medir suas irreversíveis consequências.

Nesse contexto, as inquietações a fim de produzir uma cosmovisão que dê conta de contornar as questões sociais, postas para a nova sociedade em formação/transformação, era necessário o surgimento, não só de uma outra forma de conhecimento, mas de uma nova ciência propriamente dita.

O estudo de formas e fenômenos sociais, pressupõe um conjunto de técnicas e instrumentos para a investigação da realidade social, este conjunto configura o método. Esse articulado entre estratégias e procedimentos, práticas e equipamentos intelectuais, permite ao sujeito investigador percorrer um caminho no processo de produção do conhecimento. Caminho no processo de produção do conhecimento. Caminho este que pode ser refeito ou posto em crise, pelo cientista que o suceder.

A ritualística, até então representada, compõe o cenário da práxis científica no que toca a operação e observação da experiência no campo científico. Nesse sentido, na grande área das ciências sociais, emergiram do prisma da racionalização três grandes tradições: o materialismo histórico dialético, o funcionalismo e a hermenêutica para uma sociologia compreensiva.

Neste universo epistemológico, onde concorrem sistemas de pensamento, que ora prezam pelo movimento e pela transformação, ora pela harmonia e estabilidade, ou então, pelo paradigma da interpretação (respectiva ao parágrafo anterior) o cientista social, se vê crítico, ante o espelho da tradição.
Com o fim do romantismo, na segunda metade do século 18 e os desenvolvimentos, por exemplo, de Humboldt, a Alemanha que havia operado com Goethe uma espécie de instauração de uma cultura de civilização, vê nos avanços oriundos de uma nova reunião de intelectuais num círculo da alta burguesia alemã no início do século 19, a aparição da sociologia compreensiva que nasce sob a égide da hermenêutica e postula métodos para interpretação do social, a partir da distinção entre explicação (eklaren) e a compreensão (verthsen) desenvolvidas entre outros, por Dilthey. Enquanto na França, Augusto Comte, reuni as mais variadas orientações das ciências naturais e aplica numa perspectiva de fundacionismo filosófico para o tratamento dos fenômenos sociais. Desde a física social ou até mesmo recursos estatísticos da matemática são invocados para significar a filosofia positiva.

As administrações de Weber, por parte da tradição alemã, e de Durkheim, da tradição francesa, apontaram durante o século 19 e, até hoje, para a leitura do todo social com distinções que vão desde o lugar da história, o tratamento do materialismo, a contradição entre dedução e indução, a determinação da parte pelo todo, do sentido no praticar e no coletivo, na propedêutica acerca de questões às ciências sociais, até hoje centrais, como trabalho e religião.

Considerando em especial a premissa postulada pelo pensador alemão Max Weber que assinala sua empreitada metodológica com a noção de “neutralidade axiológica”, nos encontramos aí neste ponto com uma problemática de tal relevância que nos faz inferir sobre a gênese da teoria social moderna, quiça dizer até mesmo que o paradigma que orienta as relações entre sujeito e objeto se altera com o tempo, com a filosofia dominante e as abordagens que predominam em dado período, nos arriscando a categorizar uma certa espécie de determinação de uma tipologia como historicismo analítico.

Nesse percurso do trajeto de fundação, criação e legitimação das Ciências Sociais, a necessidade de autoafirmação de uma maneira própria de fazer ciência e a busca por reconhecimento do saber produzido nesta esfera, levou os cientistas sociais do final do século 19 até o início do século 20, a exemplo de Weber, a desenvolverem soluções metodológicas e epistemológicas para o estabelecimento de uma normativa, que organizasse e pudesse justificar o conhecimento produzido nesta seara científica.

No caso especifico de Weber o recurso utilizado foi além da construção dos “modelos” através dos “tipos ideais” foi a busca por uma transparência metodológica, que tomou forma concreta no debate sobre a objetividade nas ciências sociais. A saída encontrada pelo autor alemão, que viveu nos EUA no começo do século passado e deu os traços finais a sua obra, antes de morrer, após retornar da América, revelou que uma tentativa para ausentar o pesquisador da parcialidade ou da classe social, raça, etnia, ideologia, interiores econômicos, ou relações de poder na qual se está envolvido, só seria possível se fosse operada uma suspensão, ou melhor, uma neutralização dos valores.No entanto, não podemos nunca esquecer que entre o individuo e a sociedade, o sujeito e o objeto, a alienação e a realidade, existe uma força que realiza uma mediação entre o olho que vê e a lente que ajuda a enxergar; a relação de interdependência entre a ação social e a história.

De forma que a “guerra” epistemológica das ciências sociais, do seu surgimento até hoje, demarca e circunscreve, ora o positivismo que caminhou até o estrutural funcionalismo parsoniano, ora a hermenêutica que alcançou uma forma contemporânea na “interpretação das culturas” de Geertz demonstrando o potencial reflexivo e plurissignificativo no processo de produção do conhecimento em ciências sociais bem como, a manutenção de fidelidade à origem epistemológica a qual o pesquisador se sente afiliado e, que segue um macroprojeto de pensamento, representando uma tomada de posição e a assunção das consequências desta escolha entre alternativas postas como tais.