domingo, 8 de julho de 2012

Lauda II


Contribuição crítica para interpretação de fragmento da obra de Max Weber: 



O lugar do trabalho na ética protestante e no desenvolvimento do capitalismo moderno.

***************************


Colocaremos em estudo um momento da obra do pensador alemão Max Weber (1864 – 1920) teórico das Ciências Sociais e responsável pelo estudo das relações existentes entre a “ética protestante”  e o “espírito do capitalismo”. Weber nasce em Erfurt, filho de um deputado e rico industrial da área têxtil. Nesta obra, o autor analisa a pertinência dos alicerces calvinistas no desenvolvimento do capitalismo. Facultando-nos perceber o grau de influência das concepções religiosas e filosóficas no desenvolvimento econômico da sociedade ocidental.

O presente texto visa apontar aspectos relevantes no que tange acerca do trabalho na esfera das relações socioeconômicas no quesito que elabora as formas da cultura. No que elabora a ética protestante em uma espécie de ascetismo puritano, na Europa berço da cultura ocidental, entendendo o capitalismo como objeto – fusão de objeto e método – numa perspectiva de  analise sociológica sustentada por uma relação casual histórica.

Em Weber os princípios filosóficos de sua abordagem sociológica como modelo para a ciência do real partem dos pressupostos apresentados no bojo das teorias de Dilthey, Windelbad, Rickert captação de relação de sentido, extraindo conteúdo simbólico para dar conta do sinn - sentido da ação.

Nesse contexto, temos o atrelamento da confissão religiosa e estratificação social, de forma que os protestantes se desenvolveram economicamente na direção de postos de trabalho elevados das grandes empresas, além de aparecerem socialmente enquanto proprietários do capital, empresários formando uma espécie de camada superior, e caracterizando-se também como mão de obra qualificada técnica ou comercialmente.

Ocorrendo assim, no interior da dinâmica capitalista baseada no trabalho, uma certa reorganização da população em camadas sociais e profissionais segundo as suas necessidades. O que por sua vez aparece enquanto causa, mas sim consequência do fenômeno histórico em estudo que é a redefinição das formas estruturais da organização sócio-econômica na modernidade. 

**************************


Assim, eis que surge no esquema teórico weberiano, como base para uma explicação racional da conjuntura que se formula, a ideia de “herança” para justificar uma determinada “educação dispendiosa” recebida por parte dos protestantes, juntamente com o fator marcrosociológico que é o enriquecimento das cidades protestantes desde o século XVI, a saber são exemplos Baden e Renânia, de modo que aparelhado por pesquisa que levantou estatísticas religiosas entre os judeus, católicos e protestantes.

Com certeza, a emancipação ante o tradicionalismo econômico aparece como um momento excepcionalmente propício a inclinação a duvidar até mesmo da tradição religiosa e a se rebelar contra as autoridades em geral. (WEBER, 2010, p.30)
Do ponto onde se opera o rompimento de visão de mundo conservantista, para a manifestação da modernidade na prática da vida social, no que toca suas relações e modos operandi no bojo de uma passagem na qual “a reforma significou não tanto a eliminação da dominação eclesiástica sobre a vida de modo geral quanto a substituição de uma forma vigente por outra”. Logo, o conjunto de valores e ethos que se elaboram nessa “substituição” por sua vez “penetrava todas as esferas da vida doméstica e pública até os limites do concebível”, o que nos permite inferir das palavras de Weber que com o trabalho não foi diferente.

No campo das doutrinas religiosas durante os períodos de dominação católica que segundo os textos do livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, dão conta do século XV seguido pela dominação calvinista nos séculos XVI e XVII ilustrando dessa maneira uma crítica a insuficiência de dominação eclesiástico-religiosa, pois que no seio da sociedade protestaniza se formularam as [classes médias] “burguesas”. Desencadeando assim a dominação cultural “consequência da superioridade estatística de seu cabedal historicamente herdado” gerando diferentemente dos católicos, que geravam – mestres artesãos –, o pathos protestante permitiu a formação de um grupo de trabalhadores que podem vir a ser identificados como “operariados qualificados” e também ao passo ocupantes de “postos administrativos” o que configura certa capacidade de liderança e por sua vez possibilidade de emergência da classe dominante através da dominação do processo produtivo.

Entendendo todo esse processo como resultante de uma “peculiaridade espiritual inculcada” que possibilitou a “escolha da profissão pela educação” num tipo de “destino profissional” o que sobre maneira concretiza o “racionalismo econômico”, mas que por sua vez se distingue do “materialismo” pois que se baseia na “secularização dos conteúdos da vida.” Sendo assim avistamos como e porque os protestantes podem ser entendidos como “detentores do desenvolvimento industrial moderno”.

**********************


Diante de um arsenal de abordagens teóricas que permitem observar um “cultura dos sentidos” na adoção da “regulamentação religiosa da vida com o mais intenso desenvolvimento do senso de negócios” o que se desdobra do “estranhamento da vida” derivado da religião que se estende em uma construção teórico prática que podemos entender sobre o signo de “espírito do trabalho”. De maneira que a compreensão do real vem com o estabelecimento do construto epistemológico posto entre objeto, sentido e explicação.

O “espírito” do capitalismo, imbuído da “natureza do objeto” revela o objetivo conceitual posto entre a “individualidade histórica” e a “significação cultural”, o “fenômeno histórico” apresentado, ou seja, o que compõem o corpus de “conexões genéticas concretas” dando aspectos que delineiam caracteres que “imperam” no sistema social como: “avareza, crédito, interesse, posses, dever” passam a definir a “essência da coisa” como um jeito de ser em função de um “ethos do ganho” que cristaliza o leitmotive do “utilitarismo”.

Dessa maneira recorremos ainda ao conceito de vocação em Lutero bem como a racionalização para explicar o processo em observação. 


A tentativa de descrever o racionalismo econômico como a feição mais destacada da vida econômica como um todo tem sido feita particularmente por Sombart, muitas vezes através de observações judiciosas e efetivas. Justificadamente, sem dúvida, se por isto se entender a extensão da produtividade do trabalho que, através da subordinação do processo de produção a pontos de vista científicos, o tem aliviado de sua dependência das limitações orgânicas naturais ao indivíduo humano. Este processo de racionalização no campo da ciência e da organização econômica determina indubitavelmente uma parte importante dos ‘ideais da vida’ da moderna sociedade burguesa. (WEBER, 1980, p.203) 

Ampliando o campo de visão da elaboração tanto para a epistemologia quanto para a metodologia vemos o pensamento sociológico apontando para investigação do processo de interação e desenvolvimento social em questão com bases na objetividade científica na determinação de relações entre religião e realidade social ao passo que vê-se também a emergência do trabalho e da economia como normas centrais da cultura capitalista moderna. 

O trabalho a serviço de uma organização racional para o abastecimento de bens materiais à humanidade, sem dúvida, tem-se apresentado sempre aos representantes do espírito do capitalismo como uma das mais importantes finalidades de sua vida profissional. Basta, por exemplo, ler a relação que faz Franklin dos seus esforços a serviço dos melhoramentos comunais em Filadélfia para compreender claramente esta virtude óbvia. (...) Similarmente, ela é uma das características fundamentais de uma economia capitalista individualista, racionalizada com base no cálculo rigoroso, dirigida com previsão e atenção para o sucesso econômico que é procurado, em chocante contraste, com a precária existência do camponês e com o tradicionalismo privilegiado do artesão da guilda e do ‘capitalismo aventureiro’, orientado na exploração de oportunidades políticas e na especulação irracional. (WEBER,1980, p.203)


Assim fundindo argumento e conceito, categorias e método temos diante um quadro da consolidação do tempo em que a história reaparece com pressuposto para a teoria sociológica clássica além de remontar os pontos de interpretação sobre bases onde uma tal sociologia da religião toma forma de projeto intelectual que fundamenta tanto o trabalho como as condições materiais a partir do estudo dos fenômenos da vida religiosa para explicar a expansão capitalista.

A busca por uma compreensão da conduta econômica dos indivíduos em relação à ética protestante, especialmente a calvinista. O que para Weber estabelece uma relação de causalidade entre a prática religiosa e acumulação de capital, a postura de alguns empresários adeptos a seitas puritanas contribuiu para a consolidação do sistema econômico vigente na modernidade. Afirma-se então que as instituições capitalistas como a grande empresa constituem a prova objetiva da racionalização do sistema qualificado por modelos precisos e eficientes.

De tal procedimento investigativo pode-se inferir que a organização de dados estatísticos de níveis de riqueza dos grupos sociais protestantes de algumas regiões da Alemanha levam o autor a procurar estabelecer uma relação entre o espirito do capitalismo e a ética protestante sendo objetivada no caráter do trabalho aliado a ascese puritana, relacionando pensamentos em torno de valores morais e éticos com o comportamento dos indivíduos no que diz respeito a ação individual e coletiva no contexto da prática capitalista.


********************


Nessa relação das condições sociais e religiosas favoráveis ao capitalismo do “tipo típico” ocidental, verifica-se este enquanto especifico frente análises da China, Índia ou em países que praticam judaísmo. Problematizando atitude peculiar em relação ao trabalho e suas implicações na arena da religião. Doutrinamento do trabalho à Deus, além de apontar o êxito econômico como símbolo de escolha para salvação, assim o trabalho se torna indubitavelmente o meio pelo qual se chega ao salvador.

Possuindo então no individualismo uma espécie de derivação psicológica que favorece a consolidação com o “compromisso eterno” posto diante da fé e que só se alcança diante da superestima do trabalho, desse jeito temos em Weber um apurado senso crítico que busca demonstrar a relação direta entre atitude religiosa e o comportamento econômico. 


Poderia, assim, parecer que o desenvolvimento do espírito do capitalismo seria melhor entendido como parte do desenvolvimento do racionalismo como um todo, e poderia ser deduzido da posição do racionalismo quanto aos problemas básicos da vida. Nesse processo, o protestantismo deveria apenas ser considerado à medida que se constituiu num ‘estágio historicamente anterior’ ao desenvolvimento de uma filosofia puramente racional. Qualquer tentativa séria, porém, de desenvolver esta tese evidencia que um modo tão simples de colocar a questão não daria resultado simplesmente por causa do fato de a história do racionalismo apresentar um desenvolvimento que absolutamente não segue linhas paralelas nos vários setores da vida. (WEBER,1980, p.203)

A direção dos interesses individuais depende do compartilhamento coletivo de uma visão de mundo e da conduta econômica numa tal gestão consciente e interessada dotada de especialização na exploração, agência e manipulação dos “bens de salvação”. E o trabalho como eixo que força, que transforma o ideal em real, justifica, regula e normatiza as condutas sendo a chave explicativa do todo que se elabora em torno do modelo de vida que permite conhecer as práticas e as motivações que as antecedem bem como as ordens e os elementos que compõem o capitalismo enquanto cultura, parte dum fenômeno histórico moderno e sociológico pois, que se entrevê  no que sobra da obra de Max Weber as fontes de manutenção  do sistema de reprodução social que persevera no organograma do ocidente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário