Hoje, por especiais razões, este bolg recebe
uma colaboração de autoria estranha ao escritor que aqui em geral publica.
Nesse sentido, apresento o texto de Olivia Maia, que comenta sobre um viés bem
característico um dos mais intrigantes fenômenos contemporâneos – o fetiche. Sem
mais, deixo-vos com o post de hoje.
Boa leitura.
"Primeiro estranha-se, depois entranha-se". Fernando Pessoa ( para uma propaganda da bebida em Portugal nos anos 20).
C.C.S.Alvarenga.
COCA-COLA –
o fetiche colonizador
Coca: a folha sagrada andina.
Cola:
a noz sagrada mandengue.
América e África,
matéria prima e força de trabalho do produto do mundo moderno? Em concomitância
com a apropriação destas fontes e forças, para uma finalidade mercadológica a
princípio e especulativa no contexto contemporâneo, nada mais natural que o
ícone de uma sociedade de pretensão globalizante seja o resultado da junção das
substâncias de poder dos maiores impérios colonizados pelo grande império do capital.
Coca-Cola é o ícone
sagrado do capitalismo. Um líquido que nasceu junto com a burguesia
norte-americana. Para o qual foi criado o grande culto à imagem. Elemento de
consagração da venda do american way of
life. Que reúne em sua embalagem exclusiva a combinação do poder mítico ancestral
e o poder economicamente racionalizado. Açúcar, cafeína, corante coral, as
matérias primas do mercantilismo e venenos que geraram os ovos da serpente da
sociedade de controle contemporânea.
Em seu artigo Feitiçaria: Terminologia e Apropriações, publicado em 2009 na
revista Sankofa, Suzane Pinho Pêpe atribui ao europeu a visão sobre as práticas
rituais africanas que as concebe enquanto fetiche e idolatria. Tal entendimento
só poderia vir a partir de uma concepção ocidental, que tende a uma espiritualidade
nestes termos. Ao apresentar as maneiras como o termo Fetiche, derivado de
feitiçaria – coisa feita – foi se
atualizando ela nos revela como a modernidade capitalista se baseia em
idolatrias e fetiches.
Dois pensadores voltados para o estudo
da indústria cultural na pós-modernidade, Theodor Adorno e Max Horkheimer (1977
apud FONTENELLE, pp. 79-80), fizeram um paralelo entre a visão de Freud e a de
Marx, e propuseram a ideia de que se estaria vivendo uma “perversão da
cultura”, provocada por uma forma social fetichista. Estenderam suas análises
para a realidade histórica americana no contexto da indústria cultural, em que
tudo se torna negócio. A denúncia de uma total “fetichização da cultura”
contribuiu para a teoria crítica da sociedade contemporânea, baseada na
exacerbação das relações de produção e consumo, na descartabilidade,
desterritorialização e descontinuidade temporal. (PÊPE, 2009, p.63)
O filme Cola-Conquest
nos apresenta diversas facetas deste fetiche e desta prática de idolatria, que
é o consumo da Coca-Cola, como uma genealogia da contemporaneidade.
Beira de mar
Beira de mar
Beira de mar na América
do Sul
Um selvagem levanta o
braço
Abre a mão e tira um
caju
Um momento de grande
amor
De grande amor
Copacabana
Copacabana
Louca total e
completamente louca
A menina muito contente
Toca a coca-cola na
boca
Um momento de puro amor
De puro amor
Referências
PÊPE, Suzane Pinho. Feitiçaria: Terminologia e Apropriações. In: Sankofa. Revista de
História da África e de Estudos da Diáspora Africana – nº 3 junho/2009.
VELOSO, Caetano. Jóia. In: Jóia, 1975.